Tuesday, October 31, 2006

coincidências

Porque felizmente há uma ordem positiva que me acompanha.
Ontem ao passear na página da Casa da Música, verifiquei que ainda havia bilhetes para o concerto da Orquestra Barroca de Amesterdão com Ton Koopman. Quase comprei bilhete. Mas a responsabilidade impediu-me porque sabia que as tarefas eram muitas, “urgentes e importantes”. Hoje de manhã quase cedi à tentação de aproveitar os bilhetes que ofereciam na Antena 2 para esse mesmo concerto. Esqueci. Às 17 horas um bilhete caiu-me do céu. Bem haja ao anjo que mo ofereceu. Percebi que com um pouco de jeito conseguia ir ao Porto, de cabeça leve, para me deixar envolver.
Assim foi. Recados e um beijo da mãe resolveram os problemas práticos.
Lá estavam montanhas de arquitectos, alguns reincidentes, outros que não via há muito. Gente mediática.
Um concerto muito bom, para os meus ouvidos e para a minha alma. Porque cada vez mais o barroco me aproxima da eternidade. Regresso às origens? Rameau – revelação. Bach pai e filho e Hayden - o Adágio enlevou-me.
Mas para além disso novamente a coincidência de encontrar, por acaso e ao meu lado uma amiga, pedaço de passado (daquele que constrói ainda, todos os dias o presente) que eu prometera a mim mesma revisitar em breve. O destino constrói história.

Sunday, October 29, 2006

Amador

Dizia hoje de manhã Olga Pratz, que adorava bandas filarmónicas. Nas bandas filarmónicas os músicos são amadores. Amador- aquele que ama e porque ama, toca, ensaia, leva para casa o instrumento porque precisa dele, porque o ama, faz parte da sua vida.
Os músicos profissionais, ensaiam, limpam os instrumentos, guardam-nos na caixa e deixam-nos ficar no local de ensaio. No dia seguinte voltarão para ensaiar e abrirão a caixa donde tiram o instrumento.
Talvez não seja totalmente assim. Talvez não seja sempre assim. Não é sempre assim, mas também é.
Interessante o conceito de amador, aproximação do conceito ao modo, a dissociação do conceito do modo, quando o conceito se torna abstracto para simplesmente nos dizer que se é amador – não profissional.

Wednesday, October 25, 2006

e porque havia de ver televisão?

“Não, não vejo televisão! E porque havia de ver televisão?”
Simplesmente porque Alberto Pimenta estava lá…mas só dei conta quando um telefonema de L. me alertou e perguntou “ Quem é este que está no canal 1?” Mudei apressadamente de qualquer canal em que o ecrã se tinha fixado há horas e reconheci Alberto Pimenta, para ouvir dez minutos de conversa fluida e interessante, em que se falou da arte- excesso, do corpo e do espírito, da dificuldade em perceber espírito através da beleza do corpo, de delatores, de história … de ser português.
Uma boa razão para ter visto a televisão que não vejo. Uma boa resposta à pergunta que inicia o “post” e que o próprio fazia no final do programa em reprodução de há talvez vinte anos.
Aqueles que farei de Mãe na próxima quinta-feira.

Saturday, October 21, 2006

Volver- Pedro Almodôvar


Um pequeno comentário sobre “ Volver”. O universo feminino lido com um olhar terno e engrandecedor. Para Almodôvar as mulheres são o máximo, as mulheres são mães, Mãe – acolhedora, confidente, cúmplice, amiga, aquela na cama de quem se dorme, com quem se tem conversas intermináveis, ainda que desfasadas no tempo. A mulher ultrapassa a mentira e desdobra-se no seu mundo, que os homens olham de fora, sempre prontos a violar: intimidade e corpo. Mas nunca penetram nesse mundo de cumplicidade e ternura. Quando um homem entra perturba sem transformar, gera o erro, rupturas e traições só reparáveis com o amor, com o voltar, volver. Irene volta para pedir desculpa a Raimunda; Raimunda encobre o assassínio revivendo o passado no presente cúmplice com Paula; Irene pede desculpa à mãe de Agustina acompanhando esta na morte.
E tudo isto, no mais leve e humorístico desencadear de cenas tétricas que nos encantam pelo meio de risos e sorrisos.
É este o nosso universo?
Também é este, à sobra da poderosa Anna Magnani.

Friday, October 20, 2006

recursos

"Às vezes ela não parecia a mesma, sir - disse Cade. - Dizia-me: "Cade, eu já ultrapassei o amor, agora odeio toda a gente, até o meu próprio filho." Eu temia pela sua razão.
(...)
O fim da morte é o princípio do sexo e vice-versa. Filhos são brinquedos abstractos, representações de amor, modelos de tempo, um recurso contra o não-ser"

Durrell, Lawrence; Constance ou práticas solitárias, Pág. 373/374; Difel

A honestidade mental que iludimos dos mais variados modos, auto elogiando-nos. Mas só ela nos permite olhar com desapego a vida - como se mais não fossemos que uma erva, uma pedra, uma gota de água... um recurso para apenas ser.

Wednesday, October 18, 2006

metas e utopia

Hoje vou dormir como um anjo. Um anjo sonhador porque …
Às vezes conseguimos atingir um sonho. Depois resta-nos sonhar com esse sonho até ao momento dele se realizar. E vai mesmo realizar-se.
Digo e penso muitas vezes que a nossa insatisfação decorre da efabulação sobre actos quiméricos e irrealizáveis. Quanto mais longe/alto pomos os objectivos, se não os entendemos como utopia, como motor de vida, mas como factos alcançáveis, quando esbarramos na impossibilidade, sofremos. Por isso, tenho para mim, que utopia é utopia, sempre longe, sempre paraíso, e metas passos intermédios que me dão a certeza de que essa utopia é irrealizável, mas que vale a pena lutar por ela. As metas, quando as atingimos, trazem bocadinhos de utopia ao nosso dia-a-dia. As metas são as parcelas de utopia que realizamos e que dão sentido ao percurso sempre ascendente da vida.
Para que não pareça totalmente abstracto: ouvi uma entrevista de manhã que me prendeu dentro do automóvel 45 minutos, parada, à espera que acabasse.
...e consegui bilhetes para o concerto do ano!!!

Tuesday, October 17, 2006

Miranda July & Me and You and Everyone You Love


Encaro Miranda July como a Laurie Anderson dos nossos tempos: em muitos lados com muitas ideias, com muitos projectos, com muita doçura. E Miranda é a nossa Laurie Anderson, a da minha geração. É contadora de estória, é poetisa nas estórias.
Me and You and Everyone We Know é uma pérola. Uma pérola pequenina para guardar num bolsinho e lembrá-la todos os dias. E é uma pérola cheia de pérolas. A pérola do peixe, a pérola do quarteirão, a pérola das lagartas e dos passarinhos. E a pérola do quadro na árvore, a pérola do quadro na árvore.
A densidade, a música, a fotografia.
O melhor filme que vi nos último anos. De chorar. Trailer aqui.

Sunday, October 15, 2006

Muhammad Yunus

A propósito do Prémio Nobel da paz dado a Muhammade Yunus reedito um post de Março.

A propósito de uma outra maneira de encarar a construção da paz, próxima da sabedoria popular " Em casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão". A paz dos ricos distingue os fazedores da guerra, a paz dos pobres começa quando se acredita na capacidade de eles mudarem os seus próprios destinos dando-lhes meios para viver... e não há paz enquanto houver pobres.

"Hoje estive numa sessão de esclarecimento da Associação Nacional de Direito ao Crédito realizada no âmbito da implementação de um dos projectos escolhidos pela Agenda 21 Local.

Empolgo-me com estas coisas e acredito. Acredito no micro, acredito nos idealistas e sonhadores, acredito na bondade das pessoas! Quanto mais micro, mais acredito.

Dói-me no entanto perceber que este não é um sentimento geral, nem sequer maioritário e ainda nem sequer de uma significativa minoria.

Mas se eu, que nasci do lado bom do mundo, sinto tantas dificuldades para tornar real um projecto, porque não acreditar que a bondade das ideias não depende da dimensão material de um projecto, mas antes das redes de solidariedade que se criam? Pouco importa que o máximo de crédito possível seja € 5000. O relevante é haver uma instituição que garanta a quem precisa dos €5000 o direito a que lhos emprestem. Esse empréstimo implica responsabilidade e confiança, provavelmente o que não é exigível a quem precisa de muitos €5000 para investir ( ou enterrar) em empresas tidas como fundamentais para a recuperação da nossa economia… e que depois, porque se perspectivam à escala global, deixam centenas ou mesmo milhares de trabalhadores ( dependentes) no desemprego.

É tudo uma questão de atitude, para mim, de valores. E poderão estar certos, não sou eu profeta que o digo, que economia social e que valores como os da coesão, são os únicos que nos podem salvar …ou por cegueira, perder-nos definitivamente."

Friday, October 13, 2006

ligação

Chamo a atenção para o http://poesiailimitada.blogspot.com/. Ao percorrer o site, com os olhos e o coração, identifiquei-me e perdi-me, sobretudo com Adam Zagajewski.

Thursday, October 12, 2006

quarta-feira 11

Este é hoje um espaço precioso. Que procurei quando cheguei e a que agora volto para…

Hoje é um daqueles dias em que procurarei poesia pelas piores razões.

Arranjarei justificações psicossomáticas para as minhas dores de cabeça.

Encontrarei justificação para subir e recolher ao vale dos lençóis com o meu livro de ocasião. Cedo, bem cedo contra o costume. E serão milhentos os pensamentos que cruzarão a minha pretendida leitura e o meu tranquilo sono.

Porquê quarta-feira 11 e não sexta-feira 13?

Quero crer que a tal sexta-feira será em alta.

Wednesday, October 11, 2006

livros

Dantes, lia livros metodicamente. Seleccionava-os conforme os gostos do momento, mas lia-os sempre até ao fim. A não ser aquelas “pedras” que por mais que se configurassem na história da literatura ou nas convenções da época, não eram de todo superáveis pela minha persistência e vontade de conhecer. Foram poucas as recusas, entre as quais conto José Saramago, em qualquer das suas versões.
A idade permite-me agora outro à vontade. Misturo livros, que leio intermitentemente, que retomo e largo, chegando quase sempre ao fim. Releio livros que me marcaram no passado, onde procuro hoje com outros olhos a seiva que outrora tanto me alimentou.
Os livros têm um lugar e um tempo. Na cama leio romances ou ensaios que nada têm a ver com a minha vida profissional. Na sala, leio livros de trabalho e jornais ou revistas genéricas ou da especialidade. Nas viagens, estudo matérias relacionadas com o que visito. Quando estou emocionalmente desperta, para o mais ou para o menos, procuro poesia. Às vezes a literatura vem ter comigo, numa imagem, numa entrevista, numa recordação. Outras, vou buscá-la deliberadamente.
Hoje, porém, fui buscar o romance do quarto para ler na sala.

Sunday, October 08, 2006

marmelada 2006


















Aqui está.
Com calma, com paz, também com Nina Simone.
Sempre saiu, como nos velhos tempos. Doce, com boa cor.
Os marmelos eram perfeitos, à custa de quê? Não sei.
Marmelada de 2006.

casa do sobreiro

Quando tudo se desenrola na certeza de que os dias se sucedem sempre.
Quando os intervalos de tempo cronológico são absorvidos pela intensidade do passado – o passado é devolvido ao presente em toda a sua plenitude, sem sobressaltos.
Porque o sobreiro permanece estático vendo passar os séculos, com os ramos estendidos sobre o jardim de verde intenso. As pedras, os musgos, o tanque, a mãe…
O tempo não passa a não ser em nós. Tanto quanto nos fecunda construindo velhos sobreiros de ramos estendidos, que num minuto, juntam séculos.

Finalmente...




...trabalho de designer e vontade de fazer este curso!

Thursday, October 05, 2006

Ainda hoje, outra vez. Dia especialmente profícuo.
A véspera de feriado é sempre boa, pela predisposição à conversa. Não há hora marcada para o dia seguinte. Não há tarefa, a não ser aquela a que me imponho por gosto – revisitar o passado. Vou a Braga - amanhã. Ver amigos antigos. Recompor pedaços que se mantiverem intactos na minha vida.

Wednesday, October 04, 2006

a propósito do fecho das urgências

Há algumas alturas da vida em que estamos especialmente débeis. Uma delas é, sem dúvida, quando esperamos do lado de cá de uma urgência de hospital notícias de alguém querido, que do outro lado se debate com a doença, a dor ou mesmo a vida. Por isso não posso aceitar, que estas situações sejam tratadas com a frieza dos números, com a eficiência economicista da boa saúde das finanças de estado. Não posso querer (crer) que tudo seja reduzido a cálculos matemáticos de rácios e distâncias e que por via deles, nos atirem para situações desumanas de mega-hospitais e urgências, onde o conforto humano e mesmo material deixa muito a desejar.

Para quando pensar que quando falamos de seres humanos não podemos apenas reduzir tudo a critérios de eficiência e eficácia? Para quando pensar, que quando falamos de vida e morte, é muito importante e eficaz acolher, ter um ombro para chorar, um espaço para sentir, para abrir a alma e deixar que os homens e os deuses (feitos homens – os nossos médicos são isso muitas vezes) dêem o seu melhor?

estrada de Sintra, desculpem da serra

Voltei pela estrada da serra, ao fim da tarde. Trazia a fruta no carro, aquela que ontem ficou por comprar... e pousei em casa. Trazia inúmeros pensamentos, gostos, amores, ilusões. Pousei no fazer do jantar, nas conversas reatadas, no trabalho... quase terminado. Ponto de situação, sempre. Ponto de situação.
Ponto- marca um momento, paragem no tempo.
Situação- Algo indefinível e mutante mesmo quando se decide fazer um ponto.
O melhor ponto de situação é um bom sono.

Tuesday, October 03, 2006

estrada da serra

Não sou Álvaro de Campos, nem percorro a estrada de Sintra.

Mas o regresso a casa, pelas 20.30 deu-me imenso gozo. A estrada sem luz, abria-se à minha frente - uma fita cinzenta iluminada pelos faróis, máximos ou médios, controlados conscientemente. Uma fita cinzenta debruada de dois traços contínuos brancos e outro, intermitente, a meio. Back a acompanhar a fita que se desdobrava ladeada pelo verde cinzento da vegetação lateral. Às vezes árvores, outras apenas ervas secas ou restos queimados dos incêndios de verão. O Outono anunciado no dia mundial da arquitectura. Ela, a arquitectura, ausente. Não era muito tarde e tudo se conjugava num início de noite calmo, sob controlo. Sob o meu controlo. Senhora da vida, da estrada, do devir, da estrada e da vida, deixando que tudo se desenrolasse na medida certa do imprevisto. Tudo o que vier será por bem. Eles, noutras paragens, dão sinais, telefonam ou não. Mas sei que estão também com o meu pensamento, no meu pensamento.

Sunday, October 01, 2006

arrumação

“Todas as coisas estão no seu lugar. Eu é que não sei onde é que elas estão.”
Padre Carvalho Correia

No mínimo, uma teoria interessante quanto à arrumação.