O meu Avô, aquele gostava de relógios e tangerinas também gostava de comboios.
A casa, que se tornou dele quando casou com a minha Avó, é o “Paço da Marquesa” casa do séc. XVIII, que se foi transformando ao longo dos tempos e subdividindo em diversas fracções e funções: era na Rua Cimo de Vila e dava para as traseiras da estação de São Bento. O meu Avô sabia o horário dos comboios e ia frequentemente esperar a sua chegada à estação. Não ia esperar ninguém, ia simplesmente esperar o comboio e conversar com o chefe da estação e com o pessoal da CP. Aliando a paixão pelos relógios e pelas horas certas à dos comboios, determinava exactamente cada atraso na chegada.
As viagens para a Lamego eram feitas, até à Régua, de comboio. Obrigava a comitiva a estar na estação com meia hora de antecedência, para proceder calmamente à arrumação dos “volumes”: pacotes contados, para não se perder nenhum na viagem. Nestes contavam-se pelo menos um gato e um canário. Como seria de esperar há imensas peripécias à volta do transporte destes animais, que enjoavam, caíam da prateleira, mas sobreviviam sempre às quatro horas em trânsito. O meu Avô gabava-se de uma vez ter feito atrasar a saída do comboio, não por sua causa, mas porque esperava uma encomenda que se atrasou por qualquer razão circunstancial.
Havia também aquela figura dos carregadores, que transportavam as malas e tinham um número que os identificava: na Régua o arrumador da família era o 4.
Estas viagens duraram muitos anos, desde que o meu pai e as irmãs eram ainda filhos até às últimas já feitas com os netos: nós, os quatro irmãos e os meus primos.
2 comments:
...para mim, depois, seguia-se a camioneta que subia por Cambres, a fumegar o seu martírio!
Que emoção que senti ao reviver antigos e bons tempos passados durante a minha infância e juventude!
O meu Pai foi sempre um homem de horas certas. O relógio comandava a sua vida e a de todos nós.
Maria do Rosário
Post a Comment