Ao ler o Expresso, caderno Actual, dei com este poema de Sophia. Como ela me interpreta com exactidão. Tão exacta que quase descarto o meu desacerto: sempre será possível a sintonia com alguém!
Escorraçadas do pecado e do sagrado
habitam agora a mais íntima humildade
do quotidiano. São
torneira que se estraga atraso de autocarro
sopa que transborda da panela
caneta que se perde aspirador que não aspira
táxi que não há recibo extraviado
empurrão cotevelada espera
burocrático desvario
Sem clamor sem olhar
sem cabelos eriçados de serpentes
com as meticulosas mãos do dia-a-dia
elas nos desfiam
Elas são a peculiar maravilha do mundo moderno
sem rosto e sem máscara
sem nome e sem sopro
são as hidras de mil cabeças da eficácia que se avaria
Já não perseguem sacrílegos e parricidas
preferem vítimas inocentes
que de forma nenhuma as provocaram
por elas o dia perde os seus longos planos lisos
seu sumo de fruta
sua fragrância de flor
seu marinho alvoroço
eo tempo é transformado
em tarefa e pressa
a contratempo.
(não sei se está bem transcrito porque é transcrição de transcrição)
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