Monday, April 17, 2006

santa bárbara



Começo a escrever sem destino. Como sem destino foram os últimos dias passados com uma grande família muito perto da natureza e da precariedade.
Ao abrir o blog descobri um post que vem de São Paulo. Abri-o. Nas fotografias reconheci alguns dos lugares por onde passei aqui em Portugal, na Beira Alta, ainda terra de paixão. Só que aqui percebi que a atitude perante a paisagem não será a mesma. Aqui estraga-se a paisagem, para marcar-se o tempo com o sentido de posse sobre o lugar. Aqui vi a Santa Bárbara destruída pela mão do homem de hoje: uma estrada aberta rumo ao topo, um morro amontoado de perdas partidas e uma Santa (Bárbara) grotesca de granito pousada em cima do morro artificial. No sopé um altar de granito voltado à paisagem e uma placa comemorativa do acto, fixo ao morro.
Santa Bárbara faz parte da minha memória. A primeira vez que lá fui, a pé, não havia outra forma de lá chegar, teria dez anos. Tínhamos partido sem destino, ou talvez o destino estivesse apenas na vontade do meu pai que nos guiou: a mim, aos meus dois irmãos e a dois primos. Subimos a encosta inclinada, com paus e uma bandeira da monarquia que sempre levávamos. Não sabíamos bem o significado da bandeira, ela era para nós apenas uma marca e um aviso que permitia a comunicação com a restante família que ficava em casa, no monte em frente e que, com os binóculos, outro objecto fetiche da minha infância, nos procurava por entre as pedras e a vegetação rasteira característica da altitude. Do alto tínhamos o mundo aos nossos pés, o nosso pequeno mundo feito uma imensidão.
A descida foi atribulada: pela sede, pela trovoada, pela chuva, pelas bolhas nos pés. E depois da descida rumo a Lalim no vale do Varosa, restava ainda a subida pela outra encosta até casa.
Voltei lá mais tarde, duas vezes ainda a pé.
Ontem fui de carro. Vi a violação do sítio arqueológico. Os meus filhos subiram um pouco mais, atravessaram a “floresta dos druidas” ( plantação densa de coníferas feita há cerca de trinta anos) e lá de cima olharam um horizonte sem mácula.

1 comment:

Anonymous said...

Bonitas palavras.
Infelizmente não acontece só em santa Barbara