Sunday, February 12, 2006

A Música

Há dias em que a música me ultrapassa, por ser perfeita para aquele bocadinho de dia, ou espaço temporal. Não consigo escrever a banda sonora da minha vida, mas sei qual é a música que tocará quando estiver a morrer e a ver os meus passos passarem-me à frente dos olhos. Conheço o seu som decadente e reconheço-a. Não sei nada de música, formalmente. Amanho-me mal com pautas e flautas e, no entanto, tenho-lhe um apego! Sinto-a sempre e todos e dias e de formas diferentes. E depois há memórias nas músicas: dias, cores, os olhos pintados com o risco preto numa manhã de fevereiro do ano passado, um fim de tarde de ressaca em Aveiro a escrever poemas sozinha, nos cafés, a pensar, o verão nos Pirineus, as viagens de carro, as praias, os ex-namorados e os pequenos almoços juntos. A música, a música!


A Música

I.
A música é
A gabardine do dia
Que corta a chuva
Até quando ela nos bate.

A chuva não molha
Quando o dia são notas
E as notas são horas.

II.
A música é
O cabide do dia
Penduramo-lo de mansinho
Pelas pontas.
Desejamos que não caia
Que não se desfaça.

E o dia faz-se
Em cal branca
Na parede da vida.
E o dia pendura-se
Na malha da música.

Até amanhã.

Olívia Rosmaninho


1 comment:

maria said...

A música é como a poesia e a poesia, às vezes, também é música. Hoje esta bateu-me à porta e foi música.