Tuesday, January 09, 2007

Meditações

A certeza de que um dia tudo isto acaba.

A força da vida e o gosto de viver.

Não sei o que reserva o futuro e também sei que não importa preocupar-me com isso. Mas a passagem do tempo assusta. Porque tenho a certeza que depois desta vida nada resta. Resta o que deixo nos outros e no mundo. Depois pergunto: pretensão? Porque esta consciência de que nada somos também é aquela que dita a humildade de nada sermos.

O que procuro? Porque luto? Porque trabalho? Para comer “viver”? Para dar condições de vida aos outros? Para permitir aos meus filhos terem momentos de felicidade?

Assusta-me pensar que há coisas boas que vou deixar de sentir e de fazer? Mas quando deixar de sentir é porque já não me interessa ou porque o relógio biológico entra noutro tempo? Vou perder ou vou ganhar? Vou sentir-me mal, ou sinto-me agora mal, porque penso que me vou sentir mal?

Somos todos iguais no começo e no fim. Quando nascemos e quando morremos. O que nos distingue é o que sentimos e o que fazemos sentir. Abençoados os que são capazes de nos fazer sentir: os que criam um magnífico concerto como o que ouço ( n.º1 para piano de Brahms); os que criam aquele especial espaço sem nome onde tudo bate certo pelo incerto, pelo desconexo; os que criam aquela imagem bidimensional que nos transporta para intemporalidade do presente. Neste reconhecimento o artista sou eu, que me perco e envolvo, que sei reconhecer no instante da solidão suprema a felicidade de ser.

“ Acautela-te, leitor, porque o artista és tu, somos todos nós – a estátua que deve desenvencilhar-se do bruto bloco de granito que a contém e começa a viver.”

Durrell, Lawrence; Clea; Quarteto de Alexandria; Ulisseia

3 comments:

Anonymous said...

Gostei muito deste "post" ... se amanhã puder ainda aqui volto!

Anonymous said...

Nenhum de nós tem fim, o fim que nos mete medo. Certo homem, mineiro, ficou soterrado numas minas lá para os lados de Ervedosa,antes de eu nascer. Nunca o conheci, portanto. Todavia, mesmo deixando de parte a longa explicação para tal, a sua personalidade teve sobre mim uma repercussão absolutamente decisiva. Era um homem notável e assim permaneceu ... há mesmo quem diga que talvez nem tenha morrido e que continua...

maria said...

Infelizmente ou felizmente também só chego aí. A nossa imortalidade está em relação directa com o que geramos e deixamos. Mas eu já cá não estou... e eu gosto de viver. Já nem estarei para ver como os outros me recordarão com ternura, nem isso me consola.Por isso só resta este exacto momento que já passou ou o outro em que me leste e me entendeste.